sábado, 20 de fevereiro de 2010

Capítulo 3: A Chegada e a Harley de Max

Cheguei ao Aeroporto de Washington às nove horas, locais.
Desembarquei rapidamente, mesmo com tanta gente.
O pai estava à minha espera na área de desembarque. Corri para ele e saltei-lhe para os braços.
-Papá! – Gritei, no meio daquele barulho todo.
-Prue! – Ele abraçou-me com força e mostrou-me que tudo ficaria bem.
Saltei do colo dele e se o pai não me segurasse cairia de rabo no chão o que não seria muito elegante, para uma chegada.
-Como estás, pai? – Perguntei, curiosa.
-Muito bem, querida. E tu?
-Também estou muito bem.
-Conta-me o que andavas a fazer, lá em Portugal? – Insistiu o pai.
-Um pouco de tudo. E tu? Tens muito trabalho na Marinha, Sr. Comandante? – Perguntei eu, com um sorriso.
-Deixei-os com as minhas obrigações. Aliás, é para isso que eu tenho subordinados.
-Se eu acreditasse no que dizes, pensaria que és um chauvinista, pai – brinquei.
-Bem, vamos indo. Só queria dizer-te antes que…bem…
-Tu namoras – acabei por ele.
-Como sabes? – O pai parecia embaraçado e espantado.
-Vê-se na tua cara, pai, estás mais feliz – retorqui eu, dando-lhe uma palmadinha nas costas. – Eu quero saber quem é que, finalmente, te prendeu.
-Chama-se Debbie e é muito linda.
Ele disse-o de uma maneira tão amorosa que eu dei por mim a sorrir de um jeito estúpido.
-Gostas dela? – Perguntei, sentindo-me ainda mais estúpida. Claro que gostava dela!
-Muito. Adoro-a. Há apenas uma pessoa a quem eu amo mais do que a ela – garantiu-me ele, abraçando-me. – Ela está a morar lá em casa.
O meu sorriso aumentou, desta vez, malicioso.
-Há quanto tempo? – O pai olhou-me, desconfiado. Eu ri. – Vais dar-me um irmãozinho?
Agora o pai parecia chocado. Como se eu tivesse cometido algum cri-me.
-Não é algo em que tenhamos pensado. Mas…tu…uh…
-Pai, calma. – Eu ri da cara dele. – Diz-me o que faz Debbie?
-Em que trabalha? – O pai sorriu. – É crítica literária.
-Como é que a conheceste? Ela não anda pelas bases da Marinha a ler, pois não? – Brinquei com ele.
-O meu antigo superior escreveu uma autobiografia e ela não gostou do que leu, então no dia do lançamento escreveu um comentário, num jornal a nível nacional, a dizer que certas pessoas não deveriam ocupar cargos elevados se não sabem sequer mentir direito. Jerks mandou-me investigá-la e acabou por pedir reformar-se, alegando cansaço. Fui promovido e fiquei com Debbie.
-Acho que vou gostar dela, afinal, foi uma das causas da promoção do meu pai… além de o fazer muito feliz…
-Muito mesmo.
Debbie estava à nossa espera no enorme 4X4 do pai. Falava rapida-mente ao telemóvel e tirava apontamentos num pequeno bloco de notas.
-Deve ter trabalho. Ela trabalha a partir de casa – informou o pai e depois fingiu uma careta inconformada. – Agora estão sempre a chegar livros a casa…
-E tu muito ralado com isso!
-Bem…assim temos vários livros que não lemos…ou eu não leio. Mas é bom ter variedade.
-Comandante Jones – chamou alguém, atrás de nós.
O pai virou-se, pronto para qualquer situação, mas eu vi apenas um rapaz a caminhar na nossa direcção.
Mas então percebi que não podia ser apenas um rapaz. Era o rapaz mais bonito que eu algo vez tinha visto. E estava a sorrir educadamente para nós.
-Uh…Max? – Perguntou o pai, confuso. – O que fazes aqui?
-Ia almoçar com os meus pais e a minha moto avariou, à entrada do aeroporto.
-Precisas de ajuda? – Perguntou Mark.
-Parece que sim – respondeu o rapaz, o sorriso espalhando-se pelo seu rosto. – Parece que a minha moto não quer pegar. Importa-se de me ajudar? Não queria metê-la nas mãos de qualquer um…
-Eu posso dar uma vista de olhos à tua Harley. Prue, querida, dás-me só um segundo…
-Uma Harley? – Repeti, maravilhada. Nunca tinha visto uma Harley ao vivo. - Posso ver?
-Porque não? – Respondeu o pai, rolando os olhos. – Pode ser, Max? Já agora, Max é a minha filha Prue. Querida, o Max é um amigo, além de ser o filho do dono do Banco de Cravenwoods.
-Prazer – disse eu, com um sorriso.
-O prazer é meu. – Embora ele estivesse a ser simpático para mim, eu percebia uma certa distância, como se eu estivesse a mais ali. Eu não ia retirar a oferta do pai, nunca na vida. Eu queria ver a Harley dele. – Claro que sim. Eu consegui puxá-la para a berma da estrada, mas mesmo assim, tenho medo que congestione o trânsito.
-Fazes ideia do que é que seja? – Perguntou o pai tirando o casaco de couro, enquanto andávamos pela rua.
-Pode ser o óleo na correia. Devia tê-la oleado na semana passada, mas passou-me completamente. Eu podia fazê-lo sozinho, mas vou jantar com os meus pais esta noite, e o Comandante conhece-os, não iam achar piada se eu fosse completamente coberto de óleo de motor. Mesmo que vá de jeans.
-Por falar neles, como estão? – Interrogou o pai, num tom jovial.
-Não faço ideia. Não estou com eles há algum tempo – respondeu ele, despreocupadamente. – Não sei porque me convidaram para jantar com eles hoje.
-Não tenho estado com o teu pai. Ele não tem passado muito tempo no Banco, pois não?
-Acho que não. Sabe que já não moro com eles, Comandante.
-Sim, claro. Eu sei que é um assunto delicado, Max…
-É um assunto sobre o qual não quero falar, Comandante – cortou ele, friamente.
Saímos, seguindo o Max. Estava uma noite calma no aeroporto. A lua cheia encontrava-se bem alta no céu, iluminando bem o caminho, as árvo-res estavam quietas com a brisa inexistente.
– Bem, a minha moto está ali. Acho que temos visibilidade suficiente e não tem muitos carros… - começou Max.
Ele tinha parado a moto debaixo de um poste de iluminação. Não podia ser assim tão estúpido, pensei. Ao menos, parecia saber contar, pensei irónica, para mim mesma.
Aquilo sim era uma moto verdadeira, não aquelas amostras que eu via na rua, em Portugal. Uma Harley era tudo o que alguém que gostasse de velocidade queria ter.
Uma rápida olhadela na correia do motor e percebi imediatamente que não o problema não era esse.
Eu não queria mostrar-me muito inteligente, mas se eu não dissesse o que sabia, ia deixá-los metade da noite a pensar.
-Pai – chamei, com uma voz concentrada, parando à beira da moto. – Pode ser do filtro do carburador.
Depois de pensar durante uns instantes, o pai acabou por concordar.
-Há quanto tempo é que não o limpas, Max?
-Eu limpo-o de meio em meio ano, mas se calhar já estou atrasado… - ele olhava-me tão espantado como se me tivesse nascido uma cauda naquele preciso momento.
-A sorte é que só é preciso limpá-lo – retorquiu o meu pai, olhando a t-shirt branca dele. – Mas vais ficar todo sujo…
-Então, não vou poder ir jantar com os meus pais…que pena – respondeu ele, sarcástico.
-Não tens aí nenhum pano, pois não? – Perguntou o pai a Max.
-Por acaso não…mas se precisar de um pano...pode usar a minha camisola…
-Eu tenho uma coisa na minha mala que pode servir de pano, pai – avisei, rapidamente.
-Bem…posso ir buscar o jipe para aqui…é mais fácil do que levar a moto para lá. Além disso, já ficas no teu caminho, Max.
-Se calhar não vou jantar com eles. Vou ligar-lhes, enquanto vocês vão buscar o 4X4. Estou cansado demais para suportar as conversas fúteis deles.
-Tu é que sabe.
-E aproveito e ligo ao velho Jim para ver se ele vem buscar a moto. Não estou com paciência para conduzir.
-Nós levamos-te a casa, Max. Apenas vamos resolver isso – ofereceu o pai.
-Mas…
-Eu insisto. Vou ficar preocupado se ficares muito tempo fora de casa!
-Eu tenho dezoito anos – resmungou ele, entre dentes. – Não sou propriamente uma criancinha, Comandante.
-Só não me deixes preocupado com o bem-estar de um amigo. Além disso, moras quase há nossa beira. Agora, eu e a Prue vamos buscar o 4X4 e vimos já.
Eu limitei-me a seguir o pai de volta ao Aeroporto.
-Como sabias que era o filtro do carburador que estava sujo? – Per-guntou-me ele, quando já estávamos a chegar ao jipe.
-A correia está bem oleada. Como se tivesse sido limpa hoje de manhã. Além disso, o problema daquelas motos é que o filtro é relativa-mente pequeno e, mesmo com uma limpeza regular, pode entupir facilmente.
-Aprendeste umas coisinhas, lá em Portugal… – Disse o pai, divertido.
-Algumas – admitam, com um sorriso. – Também aprendi a conduzir, embora não tenha idade lá. Mas não te vou pedir para conduzir o jipe hoje.
-É um carro grande… - contrariou o pai. – E quem te ensinou a conduzir?
-Um amigo – respondi, com um enorme sorriso na cara. – E tu, indi-rectamente. Além disso, aprendi umas coisitas de mecânica quando escrevi um comentário para uma revista de motos sobre as minhas motos preferidas. Falei sobre a Harley.
-Que sorte a nossa! Poderíamos ter ficado a noite toda à procura da avaria…por falar em avarias, o que é que tens na mala que possa servir de pano?
-Uma coisa que nunca na vida vestiria – respondi, pensando no vestido branco e curto que a mãe e o marido me tinham dado, no Natal.
-Está bem. Deve ser alguma ideia da tua mãe. Não te censuro… - disse o pai, na brincadeira.
Debbie estava à nossa espera à porta do 4X4.
-Então? – Disse, suavemente, quando nos aproximamos. – Problemas?
-O Max teve um problema com a moto dele e pediu-me ajuda – expli-cou o pai, virando-se, depois para mim. – Debbie, a minha filha, Prue. Prue esta é a Debbie, a minha namorada.
-Prazer em conhecer-te, Debbie. Ouvi dizer que prendeste o pai – cumprimentei eu, com um sorriso verdadeiro.
-Pois… - disse ela, um bocado embaraçada. – Acho que foi ele quem me prendeu, mas também gosto de pensar que fui eu. O prazer é meu, Prue. E bem-vinda a Cravenwoods.
-Obrigada, Sra. Crítica Literária – brinquei.
-Por falar nisso…novo livro para ler – avisou ela. – Ainda não saiu.
-Posso ler? – Perguntei entusiasmada. – É sobre quê?
-Um romance policial, sobre uma série de mortes, um polícia muito atraente e uma advogada especial. E claro que podes ler. Gosto de uma segunda crítica quando estou a fazer o meu trabalho.
-Não podias ter encontrado melhor sócia, Debbie – elogiou-me o pai. – Não sei como é que tu consegues ter tanta coisa na tua cabeça, querida!
-Anos de prática, pai. Mas vamos ajudar o teu amigo, antes que ele desapareça!
-É o Max? – Perguntou Debbie, com um sorriso malicioso na minha direcção.
-Sim – respondeu o meu pai.
-Então, vamos ajudá-lo – concordou Debbie. – O Semour trouxe as malas da Prue. Já estão no porta-bagagem.
-O Semour é um óptimo agente – elogiou o pai. Bem, pensei eu, o Semour tem um nome esquisito.
Entrei para o banco de trás e o pai arrancou em direcção à saída do Aeroporto.